Em “Live”, lideranças debatem impacto das MPs nos direitos trabalhistas

O aprofundamento do retrocesso na legislação trabalhista vem preocupando as lideranças, que utilizam o recurso das “Lives” para debater e manter a mobilização contra os sucessivos ataques aos direitos sociais. Aprovada em julho de 2017, com o pretexto de combater o desemprego e a crise econômica no país, a Reforma Trabalhista (Lei 13.467) deu início a um processo de precarização nas relações de trabalho, no qual os trabalhadores são duramente penalizados.

Dispostos a abordar os desdobramentos desse processo, a partir da edição das medidas provisórias 927 e 936, participaram de uma “Live”, na noite de 28/05, Norton Jubelli, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT-RS), Guiomar Vidor, presidente da Federação dos Empregados no Comércio de Bens e Serviços do Rio Grande do Sul (Fecosul) e presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB-RS); Abigail Pereira, Secretária da Mulher da CTB Brasil e ex-Secretária de Turismo do Rio Grande do Sul; Marcelo Feltrin D’Ambroso, desembargador do TRT-4 e diretor Legislativo do Instituto de Pesquisas e Estudos Avançados da Magistratura e do Ministério Público do Trabalho (IPEATRA).

Observando a perda de qualidade nos empregos, após a aprovação da reforma, o presidente da UGT gaúcha lamentou o fechamento de 860 mil postos de trabalho, apenas no mês de abril, em decorrência dos efeitos da pandemia do Covid-19. Somados às duas primeiras semanas de março, a proporção alcança 1,1 milhão de desempregados, que engrossam a já alarmante marca de 12,8 milhões de trabalhadores sem emprego. Para Jubelli, considerando a População Economicamente Ativa (PEA), temos uma grande parte de desocupados que não integra a estatística do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nos quais se incluem uma parcela de estudantes, que não trabalha mas estuda, e os desalentados, também chamados de “nem-nem”, que nem trabalha, nem estuda e não está procurando emprego.

O sindicalista ainda aponta o recorde da taxa de informalidade, alcançado em agosto de 2019, com 41,4% da população ocupada nesta situação, conforme dados divulgados em 31 de março de 2020, pelo IBGE, na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua).

“ABERRAÇÕES JURÍDICAS”

As medidas provisórias, que poderiam representar um ponto de partida para garantir empregos, bloquearam a possibilidade de participação dos sindicatos no processo de negociação dos acordos. Tal perfil deu às MP’s caráter impositivo e desequilibrou a correlação de forças entre empregadores e empregados. “Mesmo nos acordos realizados tomando por base a MP 936, que autoriza a redução de jornada e salários e que houve a participação dos sindicatos, o impacto negativo foi somente amenizado”, comenta o líder ugetista.

Os debatedores indagaram sobre os rumos das relações trabalhistas em um contexto em que os mecanismos de proteção estão cada vez mais escassos e as entidades de classe que faziam a defesa da manutenção dos direitos lutam pela própria sobrevivência. O questionamento sobre a negação da importância da representação sindical se justifica a partir da reação dos trabalhadores após a celebração de acordos que impediram perdas ainda maiores do que as propostas pelo empregador.

Classificando as medidas provisórias como “aberrações jurídicas”, Marcelo D’Ambroso declarou que as medidas tiram proveito da excepcionalidade da situação para rebaixar ainda mais os direitos sociais, especialmente dos trabalhadores da saúde, que prestam serviço essencial no contexto da pandemia. O magistrado apontou a imposição da carga horária 12X12 como “impraticável”, que prevê 12 horas de trabalho por 12 horas de descanso. Também discorda da ideia de fazer com que o acordo individual prevaleça sobre a lei e espera que o Congresso e o Poder Judiciário estejam vigilantes para impedir tal distorção, com base nos princípios da inconstitucionalidade e inconvencionalidade.

“Enquanto as pessoas estão aturdidas com as mortes e o risco de contágio, os bancos faturam mais”, assinalou D’Ambroso, para quem é preciso protestar. Na visão do diretor Legislativo do IPEATRA, o Estado existe para servir o povo e que essa finalidade, em um momento de crise, se traduz em garantia de renda mínima das pessoas, a sobrevivência das pequenas empresas. D’Ambroso adverte que as MPs andam no sentido contrário aos preceitos da Constituição Federal e dos pactos e convenções dos quais o Brasil é signatário.

ALTERAÇÃO DA MP-936

Guiomar Vidor ressaltou que o Mundo do Trabalho vem sofrendo com a limitação das garantias sociais mínimas, com o esfacelamento da legislação trabalhista e a edição de medidas provisórias aprofundam o retrocesso. Nesse contexto, o enfraquecimento das entidades sindicais é um componente central no processo de retirada de direitos. Vidor observa que, na história recente da República, não tivemos um Congresso de perfil tão conservador.

O líder comerciário aproveitou a “Live” para anunciar a aprovação de parte do relatório do deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), na noite de 28/05, sobre a Medida Provisória 936/20, que permite a redução de salários e da jornada de trabalho ou a suspensão do contrato trabalhista durante o estado de calamidade pública relacionada ao coronavírus. As alterações admitem a presença dos sindicatos em negociações de suspensão de contrato e redução de jornada e salários, envolvendo trabalhadores que ganham até dois salários mínimos; a ultratividade das normas positivas, que asseguram a vigência das normas incluídas em convenções coletivas após o período da pandemia, e obrigatoriedade da realização das rescisões contratuais nos sindicatos, entre outras medidas positivas.

O anúncio ameniza notícias negativas como a apresentação do parecer do deputado Celso Maldaner (MDB/SC) sobre a Medida Provisória 927, que “dispõe sobre as medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública”. Em seu parecer, Maldaner aprova a MP na forma de PLV (Projeto de Lei de Conversão) e, como ele mesmo antecipou há algumas semanas, ressuscita vários dispositivos da MP 905, que foi revogada em 20 de abril por Bolsonaro. A MP 927 foi a primeira MP editada por Bolsonaro com os primeiros ataques aos trabalhadores e privilégios às empresas, sob a desculpa de combate à pandemia. O texto recebeu 1.082 emendas. Mas, a maioria foi rejeitada pelo relator.

Renato Ilha, jornalista (Fenaj 10.300)