Juíza defende Estatuto do Trabalho “enxuto e eficaz”

Uma audiência pública interativa da Subcomissão Temporária do Estatuto do Trabalho, realizada na manhã 6 de novembro, no Senado, teve como tema “O Estatuto do trabalho: uma lei para todos”. A subcomissão foi criada no começo de agosto para aprofundar os debates sobre a reforma trabalhista e apresentar propostas para a criação do estatuto. A sessão foi coordenada pelo vice-presidente, senador Paulo Paim (PT-RS). Entre os convidados, a ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Kátia Arruda, e a desembargadora do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2ª Região Silvana Abramo, e Miguel Salaberry Filho, secretário nacional de Relações Institucionais da União Geral dos Trabalhadores.
A Juíza do Trabalho no Tribunal Regional do Trabalho da Quarta Região (RS), Valdete Souto Severo, acusou a terceirização de ser “pior das chagas das relações de trabalho no Brasil” e esclareceu que essa forma de organização estrutural não resulta da reforma trabalhista, mas que ocorre como parte do desmanche da própria função do Estado brasileiro e da função do servidor público, a partir da década de 60. Em trabalho de campo feito em Brasília, do qual a jurista participou, foi contatado que pelo menos a metade dos servidores que trabalham nos três poderes de Estado são terceirizados.
A convidada saudou a criação de mais um espaço de discussão sobre o Mundo do Trabalho, justamente em um momento de crise e de exceção, como o vivenciado atualmente. Para ela, “mais do que resistir, é preciso avançar”, ao reconhecer as perdas que sofremos, talvez por nossa própria omissão. Também compreender que a principal arma de luta disponível para os que lidam com o direito é a linguagem, o discurso, que deve ser de resistência e de resgate das conquistas perdidas ao longo das últimas décadas.
POR UM ESTATUTO “ENXUTO”
Sobre a apresentação do Estatuto do Trabalho, Valdete Souto Severo pregou a superação da ideia de que tudo tenha de ser colocado em um só texto de lei. Será preciso um estatuto “enxuto”, advertiu a juíza, afirmando a necessidade de constar poucos artigos, que digam o necessário e que, sobretudo, esteja baseado na Constituição de 1988.
A magistrada lembrou que a Constituição não vem sendo cumprida e que o desafio será construir um estatuto que garanta que os trabalhadores e trabalhadoras não possam ser contratados mediante terceirização, porque o inciso I do Artigo 7º assegura a todos eles a relação de emprego, que não trabalhem mais que oito horas diárias, nem em ambientes nocivos à saúde e segurança, conseguiremos efetivar o que diz a Constituição de 1988 e avançar significativamente.
O Estatuto do Trabalho, que segue tal direção pressupõe a completa revogação do que chamou de “excrescência” da lei da reforma trabalhista. Olhar para a frente e descobrir caminhos para resgatar o direito do trabalho e a existência da Justiça do Trabalho, que é um espaço de fala do trabalhador, como mediadora dos conflitos entre capital e trabalho.
O PAPEL POSITIVO DO DIREITO DO TRABALHO
Falando em Estatuto dos Trabalhadores e Trabalhadoras, a juíza citou a existência de um argumento que prega “serem todos trabalhadores” e que “preservar o trabalho é – em última análise -, preservar a empresa”. No contexto das relações trabalhistas, a magistrada nega a afirmação, visto que o Direito do Trabalho não cuida de qualquer trabalho, mas daquele está incluído em uma relação social, que pressupõe a possiblidade de que seres humanos vendam tempo de vida por remuneração e que sobrevivam assim. A troca pode ser feita, inclusive, com prejuízo da saúde, que pode ser compensada por meio do pagamento de uma adicional de salário, calculado sobre o valor do salário mínimo.
O Direito do Trabalho procura impor limites à exploração e estabelece pontos a partir dos quais tal exploração não é possível, não permitindo que o trabalhador seja transformado em “coisa” no ambiente de trabalho e continuem tendo, em alguma medida, a dignidade preservada. Que o estatuto deixe claro estarmos tratando desse trabalho assalariado, que é vendido como mercadoria e que aceitamos dessa forma.
Um número pequeno de artigos e normas que expressem o que está escrito na Constituição e para que sejam efetivamente cumpridas. Uma das questões que podem ser relacionadas é a que se refere à garantia contra a demissão arbitrária e sem justa causa. Assim poderemos resgatar a questão da estabilidade, que está perdida na CLT, e o fim da justa causa, que é um absurdo.

Renato Ilha, jornalista (MTb 10.300)