Ritmo lento da vacinação custa vidas de brasileiros

Uma carta aberta à população intitulada “O País Exige Respeito; a Vida Necessita da Ciência e do Bom Governo” e subscrita por personagens da vida brasileira, coloca o Brasil no epicentro mundial da Covid-19, com a maior média móvel de novos casos. No caminho para atingir a marca de 3 mil mortes por dia e um total de mortes acumuladas de 300 mil ainda no mês de março, o quadro fica mais alarmante com o esgotamento dos recursos de saúde na grande maioria de estados, com insuficiente número de leitos de UTI, respiradores e profissionais de saúde, uma situação que tem levado à morte pacientes na espera pelo atendimento.

O efeito devastador da pandemia sobre a economia revelou a precariedade do nosso sistema de proteção social, particularmente dos trabalhadores informais, que constituem mais de 40% da força de trabalho e não têm proteção contra o desemprego.

No ano passado, o auxílio emergencial foi fundamental para assistir esses trabalhadores mais vulneráveis que perderam seus empregos, ajudando a reduzir a pobreza e evidenciando a necessidade de melhoria do nosso sistema de proteção social. Medidas que apoiem os mais vulneráveis, como o auxílio emergencial, são essenciais enquanto a pandemia perdurar.

SITUAÇÃO DESOLADORA

Assim como a crise sanitária, a situação econômica e social é desanimadora: o PIB encolheu 4,1% em 2020 e a taxa de desemprego, por volta de 14%, é a mais elevada da série histórica. A retração da economia afetou trabalhadores mais pobres e vulneráveis de maneira desproporcional, com uma queda de 10,5% no número de trabalhadores informais empregados, aproximadamente duas vezes a queda proporcional no número de trabalhadores formais empregados.

Embora a saída definitiva da crise dependa do ritmo da vacinação em massa da população, a pandemia só será controlada quando houver uma atuação competente do governo federal. Infelizmente, o quadro ainda pode piorar caso não haja esforços efetivos de coordenação nacional no apoio a governadores e prefeitos para limitação de mobilidade.

Utilizando mal os recursos de que dispõe, inclusive por ignorar ou negligenciar a evidência científica na montagem das ações para lidar com a pandemia, o governo federal não consegue desprender-se da campanha eleitoral de 2018. Transcorridos mais de dois anos de mandato, o atual governo ainda não desceu do palanque.

VACINAÇÃO EM MARCHA LENTA

O Brasil poderia estar em melhor situação, pois é dotado de infraestrutura para tanto. Em 1992, conseguimos vacinar 48 milhões de crianças contra o sarampo em apenas um mês. Hoje, em torno de 5% da população recebeu ao menos uma dose de vacina, o que nos coloca na 45ª posição no ranking mundial de doses aplicadas por habitante.

O ritmo de vacinação no país é insuficiente para vacinar os grupos prioritários do Plano Nacional de Imunização (PNI), no primeiro semestre de 2021, o que projeta para 2022 a possibilidade de vacinação para toda a população. Na semana iniciada em 8 de março foram aplicadas, em média, apenas 177 mil doses por dia. Nesse ritmo, levaríamos mais de 3 anos para vacinar toda a população.

Em meio à escassez de doses de vacina, com recorrentes atrasos no calendário de entregas, é urgente o reforço de medidas de distanciamento social. Da mesma forma como a introdução de incentivos e políticas públicas para uso de máscaras mais eficientes, em linha com os esforços observados na União Europeia e nos Estados Unidos.

VACINA É A SOLUÇÃO

Lembremos que a redução do nível da atividade nos custou uma perda de arrecadação tributária apenas no âmbito federal de 6,9%, aproximadamente R$ 58 bilhões. O atraso na vacinação irá custar em termos de produto ou renda não gerada nada menos do que estimados R$ 131,4 bilhões em 2021. Nesta perspectiva, a relação benefício custo da vacina é da ordem de seis vezes para cada real gasto na sua aquisição e aplicação. A insuficiente oferta de vacinas no país não se deve ao seu elevado custo, nem à falta de recursos orçamentários, mas à falta de prioridade atribuída à vacinação.

Apesar do negacionismo de alguns poucos, praticamente todos os líderes da comunidade internacional tomaram a frente no combate ao Covid-19 desde março de 2020, quando a OMS declarou o caráter pandêmico da crise sanitária.

O desdenho à ciência, o apelo a tratamentos sem evidência de eficácia, o estímulo à aglomeração, e o flerte com o movimento antivacina, caracterizou a posicionamento da liderança política maior no país. Essa postura reforça normas antissociais, dificulta a adesão da população a comportamentos responsáveis, amplia o número de infectados e de óbitos, aumenta custos que o país incorre.

Miguel Salaberry Filho é presidente do SECEFERGS – Sindicato dos Empregados em Clubes e Federações Esportivas do Rio Grande do Sul e Secretário Nacional da União Geral dos Trabalhadores (UGT)