Vice da UGT, Alemão discorda do messianismo associado à figura de Lula

O contexto da condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi classificado como “previsível” pelo sindicalista Enílson Simões de Moura – o conhecido “Alemão”. Vice-presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), o dirigente sindical via como provável a negativa do Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) ao pedido da defesa de Lula por um habeas corpus ao petista. Para Divergindo da opinião de quem viu com surpresa o voto da ministra Rosa Weber, “Alemão” disse haver coerência na posição da magistrada, relativamente às decisões anteriores adotadas por ela.

O ugetista acompanhou a votação pela televisão as notícias sobre a ordem de prisão emitida pelo juiz Sergio Moro para o ex-presidente Lula. Assumindo postura crítica, o sindicalista defende o combate ao messianismo, que cerca afigura de Lula, chamada por ele de “tendências populistas”.

Contemporâneo de Lula e testemunha do surgimento do fundador do Partido dos Trabalhadores (PT), “Alemão” foi companheiro de cela do ex-presidente, por trinta dias, em 1980, quando era militante do Movimento Revolucionário 8 de outubro (MR-8), naquela que foi a primeira prisão de Lula, ainda durante a ditadura militar.

Naquela época, os militantes de esquerda adotavam codinomes e o apelido de Enílson Simões de Moura era “Alemão”. Transcorridas mais de três décadas e com 67 anos de idade, os dois trilharam caminhos diversos: em 1980, emergia o movimento grevista que deu notoriedade à Lula e ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, quando 140 mil operários sustentaram paralisação histórica, que levou o governo militara a enquadrar Lula e outra lideranças na Lei de Segurança Nacional — um dispositivo criado em 1935, na ditadura Vargas, que punia com rigor quem afrontasse “a ordem política e social”.

“Alemão” era o representante dos funcionários da Volkswagen e participou de mobilizações que culminaram nas grandes greves operárias de 1979 e 1980. Nesse período em que os dois se conheceram. O ugetista recorda que foi capturado pela polícia durante uma passeata organizada em favor das lideranças presas, sendo levado para a sede do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) o mais temido órgão de repressão da ditadura, na época chefiado por Romeu Tuma, nome forte do regime, sempre associado à mortes e torturas de prisioneiros políticos.

“Entre os sindicalistas – observa “Alemão” – prevalecia a impressão de que a ditadura chegava ao fim, quando o General João Batista Figueiredo – o último governo militar -, cedia ao promover a abertura política.

O vice-presidente da UGT recorda as sucessivas prisões a que foi submetido, mas releva que, em 1980, seria diferente, devido à ampla cobertura da imprensa. A mobilização social chamava a atenção dos jornais, que condenavam a violação dos direitos dos prisioneiros.

A atuação do movimento sindical estava voltada para a chamada “luta econômica”, voltada para a conquista de melhores salários e condições de trabalho. Diferente de “Alemão”, que militava em um dos movimentos clandestinos da época, Lula se limitava a dizer que a ideologia dele era “ser torneiro mecânico”. A distância ideológica tornava o ambiente da cela despolitizado.

Apesar da fama de carrasco, Tuma permitiu que Lula saísse da prisão para comparecer ao velório da mãe, em uma espécie de gentileza. “Alemão” relembra que a ele também foi admitida a visita da ex-mulher e da filha de dois anos, que adoecera naqueles dias. Os três passaram um dia inteiro juntos numa das salas do Dops.

O vice-presidente da UGT relata que houve interrogatórios, sem registro de torturas, apesar da greve de fome no 20º dia de detenção, proposta pelo sindicalista Zé Maria de Almeida, que mais tarde viria a liderar o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados (PSTU).

Fonte: O GLOBO